A comunicação das abelhas sem ferrão tem também muito a ver
com o tipo de estratégia que elas usam para buscar recursos como pólen e
resina. O nome disso é “forrageio”. Então, o tipo de comunicação das abelhas sem ferrão tem a ver com as estratégias usadas para forragear.
Algumas abelhas, como a iraí (Nannotrigona testaceicornis), não “marcam” o caminho até o alimento, como outras
espécies e faz parte do grupo chamado de abelhas com “forrageamento solitário”.
O que acontece nessa abelha é que cada uma busca alimento por si só; como já
falei, quando uma abelha que encontrou uma fonte de alimento adequada volta ao
ninho, ela avisa através de som para as outras, mas ela não marca essa fonte.
As companheiras saem do ninhos sabendo que tem alguma coisa interessante pra
pegar. Por conta dessa estratégia, elas são muito eficientes para encontrar
comida. Em um experimento em que pesquisadores procuraram descobrir quais as
estratégias de forrageamento das abelhas sem ferrão (para isso eles usaram “iscas”
contendo água com açúcar, simulando flores e não flores propriamente ditas,
para ter um maior controle), essa espécie esteve entre as primeiras a encontrar
a comida e entre as que descobriu um maior número de “iscas” de alimento. Ao
fim experimento, aproximadamente um dia e meio, de 114 “iscas”, elas tinham
encontrado 109.
Já outra, que está entre as “forrageadoras de grupo”, faz as
trilhas de que falei na postagem sobre comunicação. No mesmo estudo do
parágrafo anterior, havia uma espécie com essa estratégia (Trigona fuscipennis; não achei o nome popular dela, mas basta saber
que é do gênero das arapuás, guaxupés e da abelha que não come pólen; esse é um
dos maiores gêneros de abelhas sem ferrão). Ela demora mais pra encontrar o
alimento, só que quando o encontra, marca a localização e outras abelhas da
mesma colônia vão atrás. O que acontece é que muitas abelhas chegam no lugar
marcado, por várias vezes chegando a “monopolizar” o alimento (falo mais disso
em outra postagem). No estudo, essa abelha demorou mais para encontrar as “iscas”,
por volta de 3 horas. Durante um dia inteiro só encontrou uma das 114 iscas
disponíveis, mas exploraram intensamente essa “iscas”. Chegou-se a contar 325
abelhas ao mesmo tempo nela. De um dia pro outro, os pesquisadores fecharam a
isca para que bichos não mexessem e no dia seguinte, as abelhas descobriram
mais iscas. Os autores especulam que isso aconteceu porque as abelhas foram em
busca da “isca” logo cedo, mas a encontraram fechada (eles abriram as “iscas”
só as 9 da manhã) e entenderam como se tivesse acabado, então foram buscar em
outros locais, encontrando outras iscas. Quando a isca inicialmente utilizada
foi aberta, elas voltaram para ela e também para outras “iscas” que haviam
encontrado. Ao fim do estudo, apenas 15 das 114 iscas haviam sido encontradas
por essa espécie.
Já outra estratégia, é a chama “forrageadoras de grupo
facultativas”. Essas espécies conseguem comunicar onde está o alimento de forma
bem eficiente, porém o forrageio das abelhas costuma ser solitário. Um exemplo nesse
estudo é a Trigona silvestriana (não
sei o nome popular de novo). Os autores falam que ela tem um comportamento
que chamaram de “saqueador”. As abelhas ficam rondando as iscas e expulsavam
abelhas que já estavam recolhendo alimento. Foi visto com certa frequência que
apenas um indivíduo dessa espécie consegui expulsar grupos de até 10 abelhas de
uma outra espécie do estudo. Além disso, em um outro estudo, os pesquisadores
perceberam que o feromônio depositado pela Trigona
silvestriana era detectado e evitado por essa outra espécie.
Esse comportamente de saque é especialmente evidente logo de
manhã. Conforme o dia passa, as T.
silvestriana passam a dar preferência a “iscas” já dominadas pela colônia.
Os autores pensam que isso seja um indicativo de que essa estratégia é
especialmente adequada para encontrar recursos com alta qualidade, localizados
e “efêmeros” (ou seja, que acabam rápido) e exauri-los antes que outras
espécies ou colônias da mesma espécie o encontrem. Ao contrário dessas “saqueadoras”,
a espécie T. fuscipennis, aquela que
forrageia em grupos e chegou a ter mais de 300 indivíduos em uma mesma “isca”,
tem uma “fidelidade”, ou constância extremamente alta. Como já foi dito, elas
passaram um dia inteiro em uma mesma “isca” e provavelmente só encontraram
outras porque pensaram que a que estavam usando havia acabado (quando foi
fechada a noite). Os autores sugerem que esse comportamento seja adequado pra explorar
recursos concentrados e que duram por mais tempo, pois conseguem “monopolizar”
o alimento.
Bom, não encontrei fotos de novo... então coloquei um gráfico do artigo que cito aqui embaixo. Nesse gráfico está a quantidade de "iscas" encontradas pelas diferentes espécies de abelha sem ferrão ao longo do tempo durante o estudo. As iscas foram fechadas às 17 horas do dia 13 de agosto e reabertas as 9 do dia 14, por isso o eixo X não é contínuo.
T. testaceicornis é a IRAÍ (mas o nome científico atual é Nannotrigona testaceicornis). Sim, os bichos podem mudar de nome científico. Lembrando, a Iraí é aquela que forrageia de forma solitária. Vejam a quantidade de iscas que encontrou. A T. silvestriana é a "saqueadora", que consegue recrutar abelhas de forma eficiente, mas busca alimento de forma solitária. Por fim, a T. fuscipennis é aquela que forrageia em grupo. Bait= "isca".
Bibliografia:
- Hubbell, S.P. & Johnson, L.K. 1978. Comparative foraging behavior of six stingless bee species exploiting a standardized resource. Ecology 59(6): 1123- 1136.
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