segunda-feira, 25 de novembro de 2013

2º ENCONTRO DE MELIPONICULTORES DO DF E REGIÃO

Mais uma reunião em Brasília.
Abaixo o email que recebi. Maiores informações com o Carlos Alberto nos telefones no final dessa postagem OU no email: meliponarioescoladf@gmail.com

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2º ENCONTRO DOS MELIPONICULTORES DO DF E REGIÃO


LOCAL :    QI  -  29  -   LAGO SUL  -  VIA BOUGANVILLE  CHÁCARA 07 - ALTIPLANO LESTE  - VIA PONTE JK

PROPRIETÁRIO: ANTONIO ROCHA  e  NICE

TELEFONE: 99511648  - 99941648


PROGRAMAÇÃO: 

08:00 Horas - CAFÉ DA  MANHà

09:00 Horas - DEMONSTRAÇÃO DAS VARIAS ESPÉCIES DE ABELHAS NATIVAS  

10:00 Horas - MULTIPLICAÇÃO DE ABELHAS, TRANSFERÊNCIA PARA CAIXA


12:00 Horas - ALMOÇO


14:00 Horas - CONCURSO DE MEL - DEGUSTAÇÃO


17:00 Horas - LANCHE  -  SORTEIOS: CAMISETA E DVD


Valor por pessoa para custear a alimentação  R$ 25,00

Criança até 10 anos não paga.

Favor confirmar presença por e-mail ou telefone, informando o número de pessoas.


(OI)- 84438100

(CLARO)- 92395282

(VIVO)- 99059711

(TIM)- 82787103


sexta-feira, 22 de novembro de 2013

As diferenças ajudam a manter a diversidade

Outro dia falei da agressividade entre as abelhas sem ferrão, o que acaba fazendo com que espécies com estratégias diferentes visitem mais um tipo de planta, de acordo com quantidade de flor e distribuição dos indivíduos dessas plantas. Fiquei com medo de isso virar uma justificativa pra saírem por aí matando abelhas, então resolvi falar um pouco mais sobre fatores que ajudam a manter todas as abelhas coexistindo e sobrevivendo, mesmo que haja conflitos.
Além do tipo de distribuição das plantas, as abelhas também "repartem" os recursos em relação a altura das fontes onde buscam esses recursos. Algumas espécies visitam plantas mais altas e é interessante (mas não inesperado) que em estudos sobre a comunicação das abelhas sem ferrão, espécies que preferem árvores mais altas conseguem comunicar a fontes dos recursos interessantes de forma bem eficiente; espécies que vão em árvores de tamanho intermediário não são tão boas e abelhas que vão em plantas baixas não conseguem comunicar a altura.
Aqui embaixo peguei um gráfico que mostra a dieta de duas espécies de abelhas sem ferrão asiáticas em diferentes tipos de vegetação. Vejam a grande diferença.

Aqui vocês vêem duas espécies (barras pretas e cinzas) e a proporção de pólen de plantas de diferentes vegetações. Canopy= copa de plantas altas. Understory= plantas que ficam embaixo dessas plantas altas e Gap= plantas que ficam fora da mara, em locais abertos e menos sombreados.

A preferência por determinadas plantas também ajuda a dividir os recursos e acho que está no mínimo indiretamente relacionado ao que falei acima. Enquanto essa espécie T. melanochepala, preferia pólen de plantas da família da fruta pão e araticum (Annonaceae), a outra, T. fuscobalteata tinha uma preferência enorme por pólen de plantas da família da mandioca e coroa de cristo (Euphorbiaceae).
Além disso e também não é muito fácil separar a causa do efeito, houve diferenças no arquitetura das flores preferidas pelas abelhas. Enquanto algumas iam em flores mais "fechadas", outras preferiam flores mais abertas.
Então, ao invés de se matar abelhas que julgamos ser agressivas, é melhor ter mais plantas. Plantar árvores, arbustos e ervas, de diferentes tamanhos, diferentes famílias, com flores de diferentes tamanhos, formatos e cores. Todo mundo sai ganhando, não só as abelhas sem ferrão, mas também outras abelhas, pássaros, morcegos e assim por diante. Tudo começa com plantas. Quanto mais planta e quanto mais tipos de plantas diferentes, melhor. Isso é um ciclo. "Plantamos plantas", que vão atrais polinizadores e gerar frutos. Os frutos vão atrais animais que comem esses frutos (como os morcegos), que vão dispersas as sementes e fazer com que mais mudas nasçam. Sem contar os bichos que vão chegar querendo comer os polinizadores e os dispersores e os bichos que vão querer comer os bichos que comem os polinizadores e dispersores. Mas faz parte, a natureza é assim. O problema é quando começamos a ter só uma espécie. Só uma espécie de planta, só uma de abelha (lembram da preocupação dos EUA com a morte das Apis?), só uma de dispersor... não é assim que funciona. Aí "dá merda".
Li esse post aqui. Por que as plantas tão dando certo? Aposto que mutias abelhas visitam essa casa, chamadas pelas plantas. Podem ou não ser as abelhas sem ferrão, as que criamos em caixas, mas não importa quais são, o que importa é que elas existem na região e devem estar aumentando bem a produção de sementes daquelas plantas e contribuindo muito pra essa "mata fora de controle" que tudo acabou virando.
Aqui em casa tenho um pé de pitanga. Deve ter uns 8 anos. Passou um tempão em um vaso, coitado, e há uns 5 ou 6 anos coloquei na terra. Ele dava poucas pitangas, mas há 1 ano e meio mais ou menos, estou criando abelhas sem ferrão e a quantidade de pitangas aumentou tremendamente. Não só frutos de pitanga, mas de muitas outras plantas, como funcho (ou erva doce).

 Bibliografia:

- Nagamitsu, T., Momose, K., Inoue, T. & Roubik, D.K. 1999. Preference in flower visits and partitioning in pollen diets of stingless bees in an Asian tropical rain forest. Researches on Population Ecology 41: 195- 202.

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

Competição e evolução

Existem muitas espécies de abelhas da tribo Meliponini, o que costumamos chamar de abelhas sem ferrão. São aproximadamente 300 espécies aqui na América do Sul e na Central. A grande maioria delas se alimenta de coisas semelhantes (pólen, néctar...) e são o que chamamos de generalistas, que visitam uma grande quantidade de espécies vegetais. Isso provavelmente vai gerar algum tipo de competição, não vai? E muitas vezes gera. Existem muitas evidências de que as abelhas sem ferrão podem competir ferozmente por alimento. A própria diferença nos tipos de comunicação e de exploração de recursos - recurso aqui é tudo que é importante pras abelhas sem ferrão... néctar, pólen, resina - que de que falei brevemente aqui, serve como um indício de que a vida das abelhas sem ferrão não é muito fácil. Por causa desse elevado nível de competição, elas adquiriram maneiras diferentes de explorar recursos, ao longo do tempo (pense em muito, muito tempo...). Não foi algo proposital; elas não decidiram que iam mudar isso ou aquilo, mas diferenças que existiam entre as espécies foram aos poucos sendo mantidas e potencializadas, é assim que a evolução funciona.
Evolução é uma coisa bem legal e o comportamento dos bichos também.
Acontecem trocas. Ninguém sai ganhando sempre. Então, existem basicamente três tipos de maneiras de se buscar e explorar recursos: 1) as abelhas podem forragear em grupo, ser agressivas e se especializar em recursos agrupados e muito "bons" e 2) abelhas forragearem sozinhas e evitarem esses recursos agrupados (por causa das agressivas), se especializando em recursos mais pobres e 3) as abelhas que ficam entre essas duas estratégias, podendo procurar alimento solitariamente e, após encontrar uma boa fonte, recrutar outras.
As abelhas que forrageiam em grupo e são agressivas precisam de muita comida, pra compensar o fato de muitas abelhas estarem juntas e as possíveis perdas em combate. Se os recursos fossem de baixa qualidade não ia compensar a energia gasta para defender esse recurso contra outras abelhas (se duas colônias de espécies agressivas se encontram, pode muito bem dar briga) e nem ia nutrir as abelhas que estivessem lá forrageando, no saldo total elas iam sair perdendo. Essas abelhas que forrageiam em "gangues" costumam demorar mais para encontrar alimentos, mas uma vez que encontram, costumam tomar posse dele e expulsar as abelhas não agressivas e as agressivas mas de colônias ou espécies mais fracas.
Já as abelhas não agressivas forrageiam solitariamente e "qualquer florzinha" é suficiente para elas: a planta não precisa ser capaz de alimentar 20 abelhas de uma vez. Além disso, encontram alimento muito rapidamente.
Em um estudo a respeito dessa competição, pesquisadores encontraram coisas interessantes. Eles analisaram cinco espécies de abelhas, de diferentes tamanhos e diferentes níveis de agressividade. Usaram para isso iscas artificiais, com glicose em concentrações decrescentes até chegar em água pura. Eles observaram que a maior abelha do estudo foi também a mais agressiva e que as iscas com maior concentração de glicose foram as iscas mais disputadas. Mas foi interessante que inicialmente até as iscas com água geraram briga e isso provavelmente é porque as abelhas que descobrem iscas novas associam todas elas com fontes de alimento, mesmo antes de provar o que tem dentro, já que com o tempo essas iscas deixaram de ser disputadas. Vale ressaltar aqui que "briga" pras abelhas muitas vezes são apenas comportamentos agressivos como trombadas ou mesmo ações como abrir as asas, que não causa dano nenhum. De vez em quando as coisas ficam piores como cortar partes do corpo de outras abelhas ou matar, mas isso só acontece quando nenhuma das outras formas mais brandas funciona, o que parece ser raro.
Outra coisa interessante foi que só a presença de espécies agressivas foi suficiente para que algumas abelhas mudassem o comportamento normal, por exemplo, demorando mais para pousar na isca quando uma abelha grande estava a vista.
Essas diferenças nas estratégias de alimentação, gera uma divisão ou "partição" ao longo do tempo.
Um grupo de abelhas se especializa em um tipo de recurso e um segundo grupo se especializa em outro. Estudando duas espécies de abelhas, uma que forrageia em grupo e outra que tem forrageamento solitário, em uma mesma espécies de árvore (da famílias do flamboyant... as abelhas gostam muito dessas plantas), foi visto que as abelhas que buscam alimento em grupo claramente preferem as árvores que ocorrem agrupadas (próximas umas às outras) e que tem uma maior quantidade de flores. Elas nunca iam em plantas solitárias. Por outro lado, as abelhas que buscavam alimento sozinho ocorriam mais frequentemente em plantas solitárias e até tentavam a sorte em plantas agrupadas e defendidas pela espécie agressiva. Se alimentavam por um tempo, mas acabavam sendo expulsas das plantas agrupadas. Então, elas usaram 4 vezes mais as plantas isoladas, que não são interessantes para as espécies que forrageiam em grupo.
Pra quem cria abelhas: não, não precisam e não devem sair matando tudo quanto é abelha grande, com medo de elas serem agressivas e atrapalharem "as suas". Mandaçaia é grande e não é agressiva, não forrageia em grupo, por exemplo. Ser grande é apenas um indício. Outra coisa, as abelhas se viram muito bem competindo há muuuuito tempo, você não precisa tentar dar uma mão a elas (às suas), se não, a atividade vai deixar de ser algo benéfico ao meio ambiente e vai virar algo ruim, porque algumas espécies vão começar a ter problemas. E apesar de as abelhas sem ferrão serem generalistas, algum tipo de diferença na dieta existe, como acabei de falar com essa questão de abelhas com um tipo de forrageio visitarem planas com uma determinada distribuição e as não agressivas visitarem outro grupo. Existem diferenças também em relação à altura das plantas que as abelhas usam... enfim, sumir espécie não é bom! Pode gerar um efeito cascata.
O ser humano tem que parar de ficar olhando só pro umbigo. Não tentem fazer da criação de abelhas sem ferrão o que fizeram com as Apis. Olha o problema que tem acontecido por lá... falei um pouco do problema aqui. Fiquei com medo de postar isso e começarem a matar abelhas por, querendo proteger as "meninas dos olhos", só que alguns amigos falaram que era legal, então resolvi fazer. Mas coloquem a mão na consciência e não façam da meliponicultura mais uma máquina de ganhar dinheiro e de sacanear as espécies inviáveis para criar ou as que não são economicamente importantes...

Senna pallida, a espécie com distribuição solitária ou agrupada, que falei acima. (fonte da foto)


Bibliografia:

- Hubbel, S.P. & Johnson, L.K. 1978. Comparative foraging behavior of six stingless bees exploiting a standardized resource. Ecology 59(6): 1123- 1136.
- Johnson, L.K. & Hubbell, S.P. 1975. Contrasting foraging strategies and coexistence of two bee species on a single resource. Ecology 56(6): 1398- 1406.

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Curso de Meliponicultura

Para quem ficou com vontade de conhecer mais sobre nossas abelhas, segue abaixo informações sobre um curso de meliponicultura (criação de abelhas sem ferrão). Será realizado em Brasília, DF. Curso recomendado, ministrado por pessoas capacitadas. 

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Boa tarde! Saudações Apícolas


-- A Associação Apícola do Distrito Federal (API-DF) e o Sindicato dos Apicultores do Distrito Federal (SINDIAPIS) tem o prazer de convidá-lo para fazer o curso de iniciação a Meliponicultura, (Criação racional de abelhas nativas sem ferrão) que será realizado, nas seguintes condições:


DATA: 23/11/2013 e 30/11/2013 ( Sábado)


HORÁRIO: De 08:00 ás 17:00 horas.


LOCAL: Federação da Agricultura e Pecuária do Distrito Federal, (FAPE-DF) no SIA TRECHO 2 LOTE 1.630 (final do trecho das concessionárias, 4 lotes após a Peugeot)


VALOR: R$ 150,00 (cento e cinqüenta reais)


As vagas são limitadas, o aluno interessado, por gentileza confirme sua inscrição pessoalmente, por telefone ou por e-mail até o dia 20/11/2013.

Aproveitamos a oportunidade para convidá-lo para participar de nossas tradicionais reuniões, onde toda quarta-feira a partir das 20:00 horas na FAPE-DF associados da API-DF e sindicalizados do SINDIAPIS, se reiunem com o intuito de aprimorar seus conhecimentos no setor.


Agradecemos a atenção e nos colocamos a disposição para qualquer esclarecimento.

Mais informações, entrar em contato com: SINDIAPIS (61) 3443-1038

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Mais um sentido diferente

Outro dia falei das mamangavas, que conseguem perceber campos elétricos em flores.
Os morcegos também tem um. Chamam de ecolocalização. Durante muito tempo ninguém entendia como os morcegos conseguiam voar tão bem a noite e isso ajudou a reputação nada boa deles, de serem seres "das trevas". Como sempre, a tendência do ser humano de jogar o que não entendem pra cesta do "é do diabo"...
Até que na década de 40, um pesquisador descobriu que morcegos emitiam sons de alta frequência, que serviam para mapear o terreno por onde voavam e até para detectar e perseguir presas, como mariposas, em pleno voo. Esse "sonar" era tão sensível, que podia detectar fios de até 1/4 de milímetro. Eles emitem sons que batem no que está a volta deles e retorna. Com isso eles conseguem obter informações como distância e tamanho do que está a sua frente pelos sons que retornam.

Esquema de como funciona a ecolocalização (sonar) dos morcegos. Isso é uma simplificação. (fonte)


Uma espécie da família do feijão, se aproveita desse sonar para ser polinizada por morcegos. Ela tem uma pétala côncava, especializada em atrair morcegos, produzindo fortes ecos quando o som do sonar bate. Quando essas pétalas são retiradas, as flores são visitadas menos vezes. Porém, não foi mostrado, para essa espécie, que essa pétala consegue fazer com que a planta seja localizada mais rapidamente (quantidade de visitas e velocidade de detecção não são a mesma coisa!) e nem que os ecos dessa pétala se sobressaiam entre todos os outros ecoes da floresta. O que acontece é que as folhas das plantas estão voltadas para várias direções e por causa disso, os ecos são refletidos em várias direções, mudando conforme a posição do morcego que está voando. Pense em uma sala de espelhos, você não vê sempre a mesma imagem enquanto anda, correto? Algo semelhante acontece com os ecos, nesse caso.
Acontece que uma espécie de liana (ou "trepadeira") cubana, que é polinizada por morcegos, tem uma folha, por vezes duas, em forma de pratos em suas inflorescências. Essas folhas tem o "cabo" (nome técnico: pecíolo) que as liga ao galho, torcido, de forma que sempre o lado côncavo das folhas fica voltada para fora, em direção a um possível polinizador. O formato das folhas, por sua vez se parece muito com o de objetos que produzem os tais ecos que não mudam independente de onde o morcego estiver, que falei acima.

A planta do estudo, Marcgravia evenia, de florestas úmidas. A= a folha em forma de prato, B= as flores propriamente ditas e C= bolsas de néctar para os morcegos.

Eles fizeram uma série de experimentos. Primeiro, testaram se os ecos das folhas realmente se mantinham constantes, comparando com ecos de folhas normais e o resultado é que a intensidade deles se mostrou mais constante do que a das folhas normais, permanecendo fortes em diferentes ângulos de incidência. Imaginando a situação de um morcego, essas folhas gerariam ecos intensos com eles em diferentes posições em relação às folhas em forma de prato, enquanto que o que acontece com folhas comuns é que a intensidade do eco que chega ao morcego diminui muito conforme ele se move em relação à folha.
Em seguida tentaram entender como os ecos das folhas em forma de prato mudavam e compararam isso com o das folhas comuns. Chegaram a conclusão que os ecos das folhas em forma de prato tem um "eco assinatura" que se mantém bem constante independentemente da posição do morcego em relação à ela, enquanto folhas normais retornam aos morcegos ecos bem diferentes conforme a posição do morcego em relação à ela muda. De novo, pensando no morcego, isso significa simplesmente que ele vai conseguir reconhecer a folha em forma de prato de diferentes posições, porque ela vai gerar o mesmo eco enquanto ele voa. Já folha normais produzirão ecos diferentes conforme o morcego voa, então não serão identificadas por ele.

Alguns gráficos que eles mostram no artigo. Não se preocupem, não é difícil de entender. No lado ESQUERDO estão (E) a força do eco que retorna da folha comum, em diferentes ângulos de incidência (-80 a 80 graus), repare como existe um pico e uma diminuição brusca e (I) o formato, ou "assinatura" do eco que retorna em diferentes ângulos, veja como como pequenas variações o "jeitão" do eco muda completamente. No lado DIREITO estão a força do eco que retorna da folha em forma de prato em diferentes ângulos de incidência, veja como é bem mais constante que o do lado esquerdo e (J) o formato ou "assinatura" do eco que retorna em diferentes ângulos, de novo, veja como existe um padrão constante com uma variação bem maior nos ângulos de incidência do som.

Esquema de como funciona a folha em forma de prato. (fonte)
Bom, isso tudo eles fizeram só com "modelos", ou seja, pegaram uma folha em forma de prato e uma folha comum, ligaram aparelhos que produzem som e fizeram esses testes. Em seguida, foram pra parte prática.
Pegaram um morcego que come néctar (nectarívoro), da espécie Glossophaga soricina e o treinaram a se alimentar em um alimentador artificial e mediram o tempo que ele levava para encontrar esse alimentador quando o mudavam de posição. Esse alimentador podia ser apresentado aos morcegos: 1) sozinho, 2) com uma réplica de folha comum ligada a ele ou 3) com a réplica de uma folha em forma de prato. Isso foi feito várias vezes.
O resultado foi que os morcegos demoraram mais para achar o alimentador sozinho e o alimentador com réplica de uma folha comum, enquanto que o alimentador com a réplica da folha em forma de prato foi encontrado sempre mais rápido.

Glossophga soricina em um alimentado artificial (esquerda) e na planta estudada no trabalho desse post (direita). (fonte da foto da esquerda e da direita)

Bibliografia:

- Simon, R., Holderied, M.W., Koch, C.U. & von Helversen. 2011. Floral acoustics: Conspicuous echoes of a dish- shaped leaf attract bat pollinators. Science 333: 631- 633.

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Morcegos e serviços ambientais

Gosto muito de morcegos! Estão entre meus bichos preferidos. Vou falar um pouco sobre eles. Um recado a quem tem acompanhado o blog (sei que na maioria são "abelheiros"): por favor, leia isso também, ainda que não vá muito com a cara desses bichos. Se vocês conseguem valorizar abelhas, certamente conseguirão valorizar morcegos (se já não o fazem!).
Morcegos são mamíferos, não são ratos voadores, não são cegos e nem dão azar, muito pelo contrário!!
Eles são o segundo maior grupo de mamíferos, com cerca de 1.200 espécies conhecidas, ficando atrás apenas dos roedores: os ratos de verdade. São os únicos mamíferos voadores do planeta! Assim como as nossas abelhas, tem uma diversidade grande de locais onde podem morar: cavernas, ocos de árvores, casas de seres humanos e alguns até "constroem" abrigos, mordiscando folhas de bananeira - e parentes delas - estrategicamente, de forma que as folhas dobrem, protegendo-os e ocultando-os.

Lá em casa, em um quartinho nos fundos, temos uns morceguinhos. Considero uma honra (apesar da sujeira que fazem). Desconfio serem da espécie Platyrrhinus lineatus. São bem curiosos, sempre nos acompanham com a cabeça quando passamos por baixo deles. 

Eles tem uma dieta muito variada: Frutas, néctar, pólen... e até morcegos que comem peixes. Sim, eles pescam! E o mais legal: não é mergulhando como os pássaros, eles detectam um peixe nadando perto da superfície da água e com garras mais fortes que a de outros morcegos, conseguem pescar. Muitos morcegos comem insetos e aqui está o primeiro ponto importante. Lembram-se dos serviços ambientais? Falei um pouquinho de polinização, mas muitos outros existem. Controle de insetos é um deles: das mais de 1.200 espécies de morcego conhecidas, cerca de 2/3 delas comem insetos, de diferentes locais, como vegetação aberta, florestas e até mesmo em plantações. No caso das plantações, foi estimado nos EUA que a perda de morcegos pode chegar a custar entre 3,7 e 53 bilhões de dólares por ano. Morcegos em geral são bichos pequenos e extremamente leves, para vocês terem uma ideia foi estimado que uma espécie de morcegos de 7,9 g precisa comer cerca de 9,9 g por noite durante a lactação, e um morcego brasileiro chega a consumir 70% de seu peso. Mas apesar de parecer pouco, isso é muito, porque morcegos comumente vivem em colônias: a estimativa é de que uma espécie (Eptesicus fuscus) com colônias de 150 indivíduos consumam 1.3 milhões de insetos por ano e outro estudo estimou que algo entre 727 e 1.455 toneladas (!!) de insetos são consumidas anualmente pelos cerca de 1 milhão de morcegos que morreram nos EUA por causa de um fungo (vou ver se falo mais disso depois...). Esses são alguns exemplo sobre controle de insetos.


Quem mexe com abelha gosta de falar que sem elas a gente está ferrado e elevar as abelhas ao nível, basicamente, de "senhoras da natureza". Entendo e realmente, elas são muito importantes, mas acreditem.... morcegos não ficam atrás delas em matéria de importância, de maneira nenhuma: enquanto as abelhas polinizam uma boa parte das plantas que comemos e uma enorme parte das que não comemos, os morcegos são os maiores responsáveis pela dispersão dos frutos. O que é dispersão? O seguinte: quando uma planta é polinizada, ela gera um fruto, que dentro tem sementes (pense em mamões e melancias). O fruto foi uma "invenção" de um grupo de plantas para que suas sementes, que é o que vai gerar outra planta, se espalhassem e não ficassem agrupados ao redor da mãe Ficar agrupado ao redor da mão não é "evolutivamente" interessante por alguns motivos, entre eles, podemos citar a competição: as sementes vão germinar e gerar minúsculas plantinhas, que demorarão muito tempo pra ficarem adultas, enquanto terão sempre a mãe, já adulta e muito maior, lá, competindo com elas; a dispersão evita isso. Outra coisa que podemos falar é a questão da genética. Mãe e filha estando próximas, é mais provável que elas cruzem, o que pode ser ruim ao longo do tempo (basicamente a mesma coisa que casamento entre parentes próximos para nós, humanos). Esse "espalhar" é a dispersão. Então, morcegos são extremamente eficientes na dispersão de plantas.

Morcegos gostam muito de frutos de embaúba (Cecropia spp.). É uma das pioneiras de que falei acima. (fonte: http://www.arkive.org/straw-coloured-fruit-bat/eidolon-helvum/image-G76679.html)

Só aqui nos neotrópicos (Américas do Sul e Central), morcegos dispersam pelo menos 549 espécies de plantas. Pelo fato de as sementes passarem rápido pelo trato digestivo dos morcegos, elas não são muito danificadas e continuam podendo germinar, mesmo depois de engolidas. Então eles são úteis para manter áreas naturais, como florestas e também ajudam na regeneração de áreas degradadas. Eles em geral gostam muito de frutos de espécies chamadas pioneiras. São árvores de crescimento rápido, que conseguem se estabelecer em locais onde não há outras árvores. Elas então criam condições ideais para que espécies menos generalistas consigam se estabelecer, por exemplo, sombreando o solo.
Outro fator que contribui para essa utilidade na regeneração de áreas degradadas, é o fato de morcegos defecarem enquanto voam. Pássaros o fazem enquanto pousados. Ou seja, as chances de sementes caírem e germinarem em locais sem cobertura vegetal é maior com morcegos do que com pássaros, que provavelmente vão defecar pousados em uma árvore e a semente nascerá abaixo de outra árvore. Um último exemplo: Morcegos em geral gostam muito de plantas da família dos figos (Moraceae). Os frutos dessas plantas, por sua vez, são procurados por várias espécies de pássaros e mamíferos, portanto, ao "plantar figos", os morcegos também ajudam a atrair e manter populações de outras espécies.
Para vocês terem uma ideia final da importância desses bichos, TODAS as espécies de morcegos na Europa são protegidas. Não só elas, como seus abrigos. Chegando ao ponto de construções onde morcegos habitam estarem protegidas contra danos ou destruição, independente de estarem ocupadas por pessoas ou não.
Portanto, valorizem e divulguem as abelhas. Especialmente as nativas do Brasil, que não se restringem às que são sociais. Porém, não se esqueçam dos morcegos!!!

Notas importantes: 1) Das mais de 1.200 espécies de morcegos que existem no mundo, apenas TRÊS ESPÉCIES se alimentam de sangue. Dessas 3, duas preferem sangue de aves, preferindo não consumir sangue de mamíferos. 
2) Outra coisa: evitem em mexer em morcegos com as mãos e nunca o façam sem luvas. Como TODO MAMÍFERO, eles podem ser portadores de raiva. Mas fiquem tranquilos, a raiva só é transmitida quando há contato com "fluidos corporais", como saliva e sangue. Ela não é transmitida por nenhuma outra forma. Portanto, basicamente, se você não morder ou lamber um morcego e nem ele te morder ou lamber, você não corre perigo. 

Existe um livro sobre morcegos brasileiro, de graça, pra baixar: Morcegos do Brasil.

Bibliografia:

- Boyles, J.G., Cryan, P.M., McCracken, G.F. & Kunz, T.H. 2011. Economic importance of bats in agriculture. Science 332: 41- 42.
- Kunz, T.H., Torrez, E.B., Bauer, D., Lobova, T. & Fleming, T.H. 2011. Ecosystem services provided by bats. Annals of the New York Academy of Sciences1223: 1- 38.
- Lopez, J.E. & Vaughan, C. 2004. Observations on the role of frugivorous bats as seed dispersers in Costa Rican secondary humid forests. Acta Chiropterologica 6(1): 111- 119.


Sites muito legais:

Casa dos morcegos (português);
Bat Conservation Trust (inglês);
Bat Conservation International (inglês).

terça-feira, 12 de novembro de 2013

Polinização e campos elétricos

Estava fuçando na internet, sobre mamangavas, e li que elas conseguem sentir campos elétricos. Fui atrás da referência, li e achei bem interessante. Nunca ia imaginar isso e cada vez mais vejo como nós somos bem limitados em se tratando dos nossos sentidos. Somos "inteligentes" (só falta aprender a usar melhor isso), mas estamos longe de estarmos no "topo" em outras coisas. Tem bichos que vêem as cores com comprimentos de onda que não enxergamos; que escutam sons que não escutamos e por aí vai.
Vou falar das mamangavas hoje. Deixo pra depois uma outra coisa extremamente interessante sobre morcegos e polinização.
As flores querem ser polinizadas. Quando existe polinização cruzada, coisa que os insetos fazem muito bem, a quantidade e/ou qualidade dos frutos produzidos costuma ser maior. Então as plantas "inventaram" maneiras de deixar suas flores atrativas para os polinizadores. Elas tem meios de chamar atenção de insetos para elas. Pode ser através de cheiro, de som, cores - tanto as visíveis, como as flores do Flamboyant (Delonix regia), vermelhas, com uma pétala branca, vermelha e amarela, quanto as invisíveis, como padrões de UV, que não vemos, mas muitos insetos enxergam -... e até campo elétrico. Mas até hoje novos tipos de "convites" estão sendo descobertos.



Como nós vemos as flores, à esquerda e como insetos vêem, à direita, quando as flores são expostas a UV, lembrando que o Sol emite luz UV, então de dia é assim que as flores são vistas por bichos que enxergam UV; nós é que precisam de uma câmera especial.... Bela diferença, não? (fonte: http://www.dailymail.co.uk/sciencetech/article-473897/A-bees-eye-view-How-insects-flowers-differently-us.html)

E quando há mais de um tipo, por exemplo, cheiro e cor, a flor chama polinizadores mais eficientemente.
Bom, abelhas geralmente ficam positivamente carregadas enquanto voam, enquanto as plantas costumam ficar carregadas negativamente. Essa diferença costuma facilitar a transferência de pólen do inseto à flor e consequentemente, a polinização e a "carga" da flor muda quando o polinizador pousa e o pólen é transferido e a planta polinizada. Como qualquer tipo de sinal que aumente a eficiência com que a flor é encontrada vai ser mutuamente benéfico - pro inseto porque ele vai ter comida e pra planta porque vai ser polinizada - é de se esperar que acabe sendo explorado.
Isso que os pesquisadores foram verificar. Se as mamangavas (Bombus terrestris) conseguem perceber e usar essas informações sobre cargas elétricas, campos magnéticos e tudo o mais.
Primeiro os pesquisadores quiseram confirmar se as mamangavas realmente ficam positivamente carregadas ao voar. Chegaram a conclusão que sim: 94% de 51 abelhas analisadas tinham carga positiva. Após isso, quiseram descobrir se a mamangava (carga positiva) produz alguma alteração na flor (carga negativa), ao polinizar e mais uma vez viram que sim. Portanto, uma flor que já foi visitada fica "marcada" e outras mamangavas vão perceber e evitar essa flor, desde que essa diferença de carga possa ser percebida e esse foi o terceiro passo do estudo.
Para isso, primeiramente os pesquisadores montaram duas flores falsas. Uma com uma carga de 30 V, que tinha uma recompensa de sacarose. Outra flor era neutra (0V) e tinha quinino (um negócio ruim demais!). A ideia é que as abelhas aprendessem a diferenciar uma flor com voltagem X e com "néctar" gostoso, sacarose e outra flor, com voltagem Y e "néctar" ruim, porque em todos os outros aspectos as flores eram idênticas.
Ao longo de 50 visitas de mamangavas às flores, houve um aumento progressivo das visitas às que tinham sacarose, chegando a uma taxa de "acerto" de 81% nas flores com essa substância. Depois disso ambas as flores foram deixadas a 0V. Depois disso, olha que legal, as abelhas não mais distinguiam entre as flores, a porcentagem de "acertos" a flor com sacarose, caiu para 54%, o que na prática (estatisticamente), não pode ser considerado diferente de 50%, que é a mesma coisa que as possibilidades de sair cara ou coroa jogando-se uma moeda honesta para cima. Depois os pesquisadores fizeram a mesma coisa, só que com as flores carregadas com 10V (na outra eram 30V, lembram?) e as abelhas já não conseguiam distinguir entre as flores boas (sacarose) e ruins (quinino) e a mesma coisa aconteceu quando deixaram as duas a 0V de novo.


Aqui estão uns gráficos, pra facilitar. No (A), a gente vê a quantidade de escolhas certas (sacarose) que as mamangavas fizeram ao longo do tempo (número de visitas). No ON é onde as flores tinham diferença de voltagem e no OFF, vemos quando as flores foram colocadas na mesma altura e ficaram ambas com 0V. Quadrado vermelho foi no primeiro experimento (30V) e azul no segundo (10V). Em (B) a porcentagem de acertos no primeiro experimento, com a diferença de voltagem de 30V em ON e sem em OFF, o mesmo para o segundo experimento, com 10V.

Continuando...
Assim como vocês viram padrões invisíveis a nós nas flores iluminadas com UV lá em cima, também existem campos elétricos de diferentes padrões que flores produzem. Esses padrões podem ser vistos quando os pesquisadores cobrem as flores com partículas eletricamente carregadas. É mais difícil de ver que na UV, mas reparem que há diferenças na "coloração", que na verdade são diferenças no campo elétrico. A diferença de coloração é na verdade uma representação apenas, porque não sentimos esses campos elétricos.

Metade superior, sem nada e metade inferior, com as partículas carregadas. (fonte: http://blog.physicsworld.com/2013/02/22/flowers-and-bees-communicate-using-electric-fields/)

Então os pesquisadores quiseram ver se as mamangavas conseguiriam distinguir entre os campos elétricos de flores "boas" e flores "ruins". Para isso, criaram duas flores artificiais, com campos elétricos diferentes. Ao longo de 40 visitas, a porcentagem de acerto foi de 70% e depois de os pesquisadores igualarem os campos elétricos das flores boas e ruins, os acertos caíram pra 47%, de novo, indistinguível estatisticamente de 50%.
Por fim, em outros estudos foi provado que quando uma flor "chama" os polinizadores de mais de uma forma, os efeitos se somam e os polinizadores são mais eficientemente atraídos. Então, os pesquisadores quiseram verificar se com campo elétrico acontece a mesma coisa. Para isso, usaram informações visuais além do campo elétrico. Eram 2 flores, uma com uma cor e um padrão de campo elétrico com solução de sacarose e outra com outra cor e outro campo elétrico e solução de quinino. Aí separaram os efeitos: o número de visitas necessário para que as mamangavas conseguissem 80% de acertos usando apenas informações visuais (cor) e informações visuais + campo elétrico. O resultado foi que usando apenas informações visuais, as abelhas precisaram de 35 visitas para aprender o que é uma flor boa e o que é uma ruim, enquanto que com informações visuais e campo elétrico, foram necessárias apenas 24 visitas.
Resumindo: 1) As mamangas conseguem distinguir as cargas elétricas das flores que foram polinizadas e das que não foram. 2) Elas também conseguem perceber os padrões dos campos elétricos gerados pelas flores e 3) Se o campo estiver associado a outros tipos de sinais, as abelhas aprendem a discriminar entre flores mais rápido.

Ah sim! E aqui está o Bombus terrestris! É uma abelha social, que foi introduzida em vários lugares, inclusive Japão e parece estar causando problemas por lá. Não existia no Brasil, pelo que sei, mas chegou aqui também. Fazem ninhos no chão.



Bibliografia:

- Clarke, D., Whitney, H., Sutton, G & Robert, D. 2013. Detection and learning of floral electric fields by bumblebees. Science 340: 66-69.

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Nem tudo são flores

Li na edição número 137 (outubro de 2013) da revista Scientific American Brasil, uma reportagem muito legal, sobre abelhas. Procurei até não poder mais, pra ver se achava essa reportagem online, para indicar aqui (e no facebook) mas não encontrei. Procurei em inglês e nada também. Resolvi escrever pra SciAm Brasil e não achei onde mandar sugestões. Bom, vou tentar resumir aqui. O título da reportagem é (em português): "O Retorno das Abelhas Nativas".

"Mason bee" (Osmia lignaria) espécie já comercializada para polinização. (foto:http://www.agf.gov.bc.ca/apiculture/factsheets/506_osmia.htm)

Quem de alguma forma se interessa por abelhas, polinização e essas coisas, já deve deve ter ouvido falar da mortandade absurda de abelhas que tem ocorrido lá fora. Chama CCD (Colony Collapse Disorder - ou algo como desordem do colapso de colônia). Ela está preocupando bastante os agricultores e cientistas. Ela não é nova, mas em 2006, um apicultor perdeu 360 das 400 colmeias que tinha... as caixas tinham pólen, mel, crias... mas nada de abelhas. Elas saíram das caixas e não voltaram mais. Depois disso (que foi no outono), até o inverno seguinte alguns apicultores chegaram a perder 90% das colmeias.
Até hoje, não se sabe ao certo o que causa esse problema, mas algumas coisas parecem contribuir, como fungicidas, neonicotinioides (pesticidas), mas o que parece ser o principal culpado, são carrapatos do gênero Varroa, na reportagem eles dizem que na Austrália, onde os neonicotinioides são amplamente usados, mas onde não existe esse carrapato, as colônias não estão tendo esse problema da CCD. Esses carrapatos, além de sugarem o "sangue" das abelhas, ainda são vetores de doenças, disseminando vírus para as abelhas.
Um outro problema, é a questão das monoculturas. Por quê? Basicamente, superpopulação e mistura de causadores de doença de diferentes locais. Eles dão um exemplo bom: imagine um monte de criança num jardim de infância juntas, cada uma misturando seus agentes patogênicos. Isso acontece porque quando as grandes culturas dos EUA estão em floração, como as amendoeiras, as abelhas são "contratadas" para polinizar. Como as monoculturas são enormes (quem puder, veja o documentário "mais que mel", ou "more than honey", vale muito a pena), muitas abelhas, de diferentes regiões do país (e portanto com diferentes "cepas", ou "tipos" de doenças, se juntam). Mas o ser humano nunca causa um tipo só de problema. Com a sua tara por dinheiro, quer transformar tudo, inclusive seres vivos, em máquinas de fazer dinheiro. Quando não é época dessas grandes floradas, as abelhas não tem tanto alimento, então os apicultores alimentas as abelhas com água açucarada, xarope, milho... o que com certeza é muito menos adequado que pólen e não só pólen, como pólen de variadas espécies vegetais. As abelhas basicamente ficam a base de fast-foods quando não estão em uma monocultura (de qualquer forma, em uma monocultura a dieta delas, apesar de natural, estará longe de ser variada...). Sem contar o estresse pras abelhas de estar cada hora em uma região.
As abelhas nativas (sim, os EUA também tem abelhas nativas; as Apis não existiam lá) foram esquecidas. Na Califórnia existiam 1.600 espécies. Mas como era de se esperar, suas populações diminuíram e algumas espécies até sumiram de alguns estados americanos. Os pesquisadores estão tentando bolar maneiras de "chamar" e manter as espécies nativas de lá perto das plantações o ano todo. Estão começando a fazer testes, por exemplo, com diferentes espécies nativas dos EUA, que floram em diferentes épocas do ano, em "manchas" no meio das plantações, para que as abelhas nativas tenham lugar para ficar e alimento durante todo o ano.
Isso está sendo feito porque a ficha caiu (para muitos, pelo menos) que depender de só um tipo de polinizador (as Apis, que estão com problemas sérios, como sempre, com nossa contribuição) não é bom, porque se ele some, as lavouras vão diminuir muito sua produção ou até mesmo parar. Na China, onde alguns lugares não tem mais polinizadores por causa de perda de habitat e aplicação indiscriminada de pesticidas, fazendeiros contratam pessoas para ficarem com (pasmem) pinceizinhos, polinizando flor por flor (isso é mostrado no documentário que falei).
Algumas dessas abelhas alternativas já são até comercializadas!
Alguns agricultores lá fora já estão investindo em ter culturas de plantas nativas para os polinizadores nativos em suas plantações e o Serviço de Conservação de Recursos Naturais do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos subsidia de 50 a 90% dos custos para isso.
E nós, brasileiros, o que podemos fazer? Nós temos muitas abelhas por aqui. Podíamos "acordar"... aprender com o trágico exemplo dos Estados Unidos. Temos as Meliponini, que são sociais, podem ser criadas em caixinhas (em sua maioria) e produzem mel... mas também temos abelhas solitárias (que não vivem em colônias com divisão de tarefa entre abelhas e com muitas gerações juntas), mamangavas de diferentes tipos (essenciais em cultivos de maracujá), abelhas de suor, abelhas de orquídea... temos abelha de todo tipo.
Ao mesmo tempo, ia ser bom tomar cuidado e não transformar essas outras abelhas em novas "máquinas". Podíamos aprender a lição...

Bibliografia:

- Rosner, H. 2013. O retorno das abelhas nativas. Scientific American Brasil 137: 64-69.
Procurem e assistam o documentário More than Honey.

domingo, 10 de novembro de 2013

Vespas com painéis solares e ar condicionado

Achei bem legal.
Essa é a vespa oriental:


Geralmente, as vespas tem um pico de atividade logo de manhã.
Mas tem uma espécie de vespa, a vespa oriental (Vespa orientalis), que tem um pico de atividade no meio do dia. É uma espécie listrada de marrom e amarelo, que vive em colônias, ou seja, é social. O ninho é subterrâneo; as vespas pegam a terra com suas mandíbulas, voam e soltam a terra a uma distância do ninho. Essa atividade está relacionada à temperatura: quanto maior a intensidade luminosa, maior a movimentação.
O número de vespas saindo dos ninhos é duas vezes maior que no resto do dia. Depois esse número estabiliza e cai repentinamente no fim do dia.
Acontece que o exoesqueleto (a "casca" que os insetos tem) dessas vespas tem uma série de características interessantes, como pigmentos (um deles, parece que existe na fotossíntese) e a capacidade de geração de "potenciais elétricos". Relacionando essas características ao fato de essas vespas terem essa diferença no horário de maior atividade, os pesquisadores quiseram ver se existe algum tipo de geração de energia no exoesqueleto das vespas.
Os resultados foram que a parte marrom é composta por sulcos extremamente estreitos e a parte amarela, feita de protrusões (pense em "calombos") muito pequenos. Essas camadas dificultam que a luz seja refletida do corpo da vespa e perdida. Mas como dito lá em cima, além dessas características microscópicas do exoesqueleto, ainda existem moléculas especializadas na "captura" de luz (ou pigmentos). Assim, as listras marrons e as amarelas "coletam" a luz e as amarelas a transformam em energia.


Esquema em 3D da estrutura microscópica das listras marrons (A) e amarelas (B) dessas vespas, retirado de Plotkin et al. 2010.

Além de ter "painéis solares" essas vespas ainda tem sistemas de ar condicionado. Uns pesquisadores estudaram a temperatura corporal externa das vespas com câmeras sensíveis ao calor. Em diferentes "tratamentos" (ao serem anestesiadas, durante a recuperação, ao voltar pro ninho e ao sair dele), as vespas sempre tinham áreas em seu exoesqueleto mais frias que o ambiente ao seu redor. Aquecer o corpo é um processo natural do metabolismo dos animais, mas o resfriamento só pode ser feito de duas formas: evaporação (ou suor) e "bombeando" calor para fora. Insetos não tem glândulas sudoríparas, logo...
E foi isso que os autores fizeram no artigo. Propuseram um mecanismo pelo qual as vespas poderiam ter um ar condicionado embutido. O mecanismo mais simples é quando há dois "corpos" (pense em um deles sendo o ar ao redor da vespa) que trocam calor e algum tipo de trabalho (mecânico ou elétrico) é usado para passar calor do mais frio para o mais quente (o inverso do normal). Para as vespas, já que nenhum tipo de trabalho pode ser realizado pelo exoesqueleto, o único meio possível é usando energia elétrica. Ao menos parte dessa energia, parece ser fornecida pelo sistema de captação de energia solar que falei acima.

Bibliografia:

- Ishay S.B., Pertsis, V., Rave, E., Goren, A. & Bergman, D.J. 2003. Natural thermoelectric heat pump in social wasps. Physical Review Letters 90(21) 218102.
- Plotkin, M., Hod, I., Zaban, A., Boden, S.A., Bagnall, D.M., Galushko, D. & Bergman, D.J. 2010. Solar energy harvesting in the epicuticle of the oriental hornet (Vespa orientalis). Naturwissenschaften 97: 1067- 1076.
http://news.bbc.co.uk/earth/hi/earth_news/newsid_9254000/9254445.stm

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Um pouco sobre polinização e abelhas sem ferrão

As abelhas sem ferrão são excelentes polinizadoras. Na postagem anterior falei sobre polinização como um serviço ambiental. Não tem como falar extensivamente de tudo aqui. Até porque não sou nenhum especialista no assunto e os próprios especialistas ainda debatem algumas coisas, mas faço o que posso.
Agora quero falar um pouco das nossas abelhas sem ferrão.
Tem uns artigos legais que tratam do assunto. Porém, a maioria é focada em plantas cultivadas. Afinal, infelizmente o ser humano só age quando mexe no bolso... se queremos preservar algo, dificilmente vamos conseguir apelando pro bicho em si; o jeito mais garantido é usar coisas que podem gerar lucro (ou impedir que prejuízos aconteçam).
As abelhas sem ferrão tem algumas características interessantes para serem usadas como polinizadoras em colheitas. Por exemplo, 1) elas são muito abundantes na América do Sul, 2) formam colônias "perenes", ou seja, colônias que duram por muito tempo e geralmente não hibernam, ficando ativas o ano todo e consequentemente "funcionando" (como polinizadoras) também o ano todo, 3) um negócio chamado "polilectilia", que significa que as abelhas usam pólen de muitas espécies diferentes, 4) o fato de elas terem a chamada "constância floral", que é a tendência que as abelhas apresentam de em cada viagem recolherem pólen de apenas uma espécie vegetal. Isto é, ela sai uma vez e colhe só pólen em pitangueiras até encher a corbícula e volta pro ninho, descarrega a carga e sai outra vez. Nessa segunda viagem, se ela resolve visitar um assa peixe, ela vai colher preferencialmente pólen de outros assa-peixes nessa viagem. 5) A comunicação delas também ajuda.... e assim por diante. Essas são características compartilhadas com as abelhas com ferrão, mas elas ainda possuem outras, que as abelhas com ferrão não tem: 1) Não ferroam! 2) Se você multiplica abelhas sem ferrão por causa das plantações , está contribuindo com a fauna (e flora) brasileira, 3) abelhas sem ferrão não conseguem "fugir", como as Apis, já que as rainhas perdem a capacidade de voar.
Além de tudo o que foi falado, vale dizer que cerca de metade das plantas tropicais economicamente importantes, são de áreas em que as abelhas de ferrão não ocorrem naturalmente. Por exemplo, Austrália e os "neotrópicos" (basicamente, as Américas do Sul e Central). Metade dessas, por sua vez, provavelmente é polinizada por abelhas. Mas isso não é uma limitação para culturas exóticas. Essas abelhas conseguem "aprender" quais outras plantas são boas fornecedoras de alimento, como aconteceu com o eucalipto, que não é natural do Brasil, mas é extensamente visitado pelas abelhas sem ferrão.
Finalmente achei figuras legais pra colocar... então aí vai:

Culturas polinizadas por abelhas sem ferrão:

Bibliografia:

- Heard, T.A. 1999. The role of stingless bees in crop pollination. Annual Review of Entomology 44: 183- 206.
- Slaa, E.J., Sánchez-Chavez, L.A., Malagodi-Braga, K.S & Hofstede, F.E. 2006. Stingless bees in crop pollination: practice and perspectives. Apidologie 37: 293- 315.

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Serviços ambientais: polinização

Existe uma coisa chamada “serviço ambiental”. Talvez algumas pessoas ainda nunca tenham ouvido falar disso, mas é um termo relativamente conhecido, traz a ideia de que o ambiente é importante. De forma simples, significa “os benefícios da natureza para famílias, comunidades e economia” ou “processos naturais através dos quais os ecossistemas suportam e possibilitam a vida humana”. Alguns exemplos são a regulação do clima (temperaturas mundiais, precipitação), controle biológico (por exemplo, regulando populações de pragas de lavoura. Em alguns lugares se criam vespas em estufas, pra que elas controlem as pestes que por ventura entrem) e controle de erosão do solo e purificação da água.
Um desses serviços é o de polinização. Achei um artigo legal sobre o assunto e vou usar informações dele daqui pra baixo (é o de 2010, na bibliografia). Não fui eu quem saiu pesquisando várias fontes; estou apenas pegando informações que acho interessantes.
Foi calculado que das estimadas 25.000 espécies de plantas com flores do mundo, cerca de 90% é polinizada por animais, sendo a grande maioria deles, insetos. E calculou-se (apesar de esses cálculos serem complicados) que dos 33 trilhões de dólares anuais que o ambiente nos “gera” por meio dos serviços ambientais, por volta de 112 bilhões vem da polinização. Dentre os insetos, por sua vez, as abelhas provavelmente são os polinizadores mais importantes. Por conta dos problemas atuais, por exemplo aquecimento global e perda de habitats, algumas iniciativas foram criadas, como a “International Pollinator Initiative” (existe um “braço” dela no Brasil).
Um dos insetos mais conhecidos e mais usados para a polinização é a abelha com ferrão (Apis mellifera). Ela consegue aumentar a produção em 96% das espécies utilizadas na agricultura que são polinizadas por animais (o nome “técnico” é zoofílicas). Além das plantas cultivadas, obviamente, as Apis são muito importantes para plantas “selvagens”, e para ambientes naturais, como florestas. O declínio que as Apis vem sofrendo em vários lugares, como EUA e Europa, gera uma grande preocupação a respeito de quais efeitos esse declínio pode ter. E apesar de o declínio de algumas espécies (como das abelhas com ferrão e as “mamangavas” do gênero Bombus) ser documentado, para outras espécies de polinizadores, incluindo outras abelhas, é escasso.
Além do problema que um declínio das populações de polinizadores causará para as nossas lavouras, ainda há a importante questão das plantas não cultivadas!!

Plantas “selvagens”:

Estou pegando emprestado o termo “selvagem” aqui. Estou chamando de “selvagem” plantas não cultivadas. Pense em uma floresta, na quantidade de plantas que tem ali, que produzem flores, e que não cultivamos em nossas plantações. Pense em ambientes “naturais”, em florestas...
Um declínio nos polinizadores pode afetar comunidades naturais, criando dificuldades para plantas polinizadas por animais. O que seria um “ciclo vicioso”: Diminui a quantidade de polinizadores. Plantas que dependem deles começam a se reproduzir menos e as populações delas começam a diminuir. Uma menor quantidade de plantas que são polinizadas por animal, por sua vez, pode fazer com que os polinizadores tenham menos alimento disponível e comecem a declinar ainda mais. Isso seria um problema particularmente grande para as plantas que tem o que chamamos de “polinização cruzada” (ou auto-incompatíveis). Ou seja, plantas que necessariamente precisam de dois indivíduos para gerar frutos e sementes. Pense em um maracujá. As populações dessas espécies geralmente começam a declinar junto com as dos seus polinizadores.

Aproveitem e dêem uma olhada no site Sem Abelha Sem Alimento!

Bibliografia:

- Costanza, R., d’Arge, R., de Groot, R., Farber, S., Grasso, M., Hannon, B., Limgurb, K., Naeem, S., O’Neill, V., Paruelo, J., Raskin, R.G., Sutton, P. & van Den Belt, M. 1997. The value of the world’s ecosystem services and natural capital. Nature 387: 253- 260.

- Potts, S.G., Biesmeijer, J.C., Kremen, C., Neumann, P., Schweiger, O. & Kunin, W.E. 2010. Global pollinator declines: trends, impacts and drivers. Trends in Ecology and Evolution 25(6): 345- 353.

terça-feira, 5 de novembro de 2013

Busca de alimento

A comunicação das abelhas sem ferrão tem também muito a ver com o tipo de estratégia que elas usam para buscar recursos como pólen e resina. O nome disso é “forrageio”. Então, o tipo de comunicação das abelhas sem ferrão tem a ver com as estratégias usadas para forragear.
Algumas abelhas, como a iraí (Nannotrigona testaceicornis), não “marcam” o caminho até o alimento, como outras espécies e faz parte do grupo chamado de abelhas com “forrageamento solitário”. O que acontece nessa abelha é que cada uma busca alimento por si só; como já falei, quando uma abelha que encontrou uma fonte de alimento adequada volta ao ninho, ela avisa através de som para as outras, mas ela não marca essa fonte. As companheiras saem do ninhos sabendo que tem alguma coisa interessante pra pegar. Por conta dessa estratégia, elas são muito eficientes para encontrar comida. Em um experimento em que pesquisadores procuraram descobrir quais as estratégias de forrageamento das abelhas sem ferrão (para isso eles usaram “iscas” contendo água com açúcar, simulando flores e não flores propriamente ditas, para ter um maior controle), essa espécie esteve entre as primeiras a encontrar a comida e entre as que descobriu um maior número de “iscas” de alimento. Ao fim experimento, aproximadamente um dia e meio, de 114 “iscas”, elas tinham encontrado 109.
Já outra, que está entre as “forrageadoras de grupo”, faz as trilhas de que falei na postagem sobre comunicação. No mesmo estudo do parágrafo anterior, havia uma espécie com essa estratégia (Trigona fuscipennis; não achei o nome popular dela, mas basta saber que é do gênero das arapuás, guaxupés e da abelha que não come pólen; esse é um dos maiores gêneros de abelhas sem ferrão). Ela demora mais pra encontrar o alimento, só que quando o encontra, marca a localização e outras abelhas da mesma colônia vão atrás. O que acontece é que muitas abelhas chegam no lugar marcado, por várias vezes chegando a “monopolizar” o alimento (falo mais disso em outra postagem). No estudo, essa abelha demorou mais para encontrar as “iscas”, por volta de 3 horas. Durante um dia inteiro só encontrou uma das 114 iscas disponíveis, mas exploraram intensamente essa “iscas”. Chegou-se a contar 325 abelhas ao mesmo tempo nela. De um dia pro outro, os pesquisadores fecharam a isca para que bichos não mexessem e no dia seguinte, as abelhas descobriram mais iscas. Os autores especulam que isso aconteceu porque as abelhas foram em busca da “isca” logo cedo, mas a encontraram fechada (eles abriram as “iscas” só as 9 da manhã) e entenderam como se tivesse acabado, então foram buscar em outros locais, encontrando outras iscas. Quando a isca inicialmente utilizada foi aberta, elas voltaram para ela e também para outras “iscas” que haviam encontrado. Ao fim do estudo, apenas 15 das 114 iscas haviam sido encontradas por essa espécie.
Já outra estratégia, é a chama “forrageadoras de grupo facultativas”. Essas espécies conseguem comunicar onde está o alimento de forma bem eficiente, porém o forrageio das abelhas costuma ser solitário. Um exemplo nesse estudo é a Trigona silvestriana (não sei o nome popular de novo). Os autores falam que ela tem um comportamento que chamaram de “saqueador”. As abelhas ficam rondando as iscas e expulsavam abelhas que já estavam recolhendo alimento. Foi visto com certa frequência que apenas um indivíduo dessa espécie consegui expulsar grupos de até 10 abelhas de uma outra espécie do estudo. Além disso, em um outro estudo, os pesquisadores perceberam que o feromônio depositado pela Trigona silvestriana era detectado e evitado por essa outra espécie.
Esse comportamente de saque é especialmente evidente logo de manhã. Conforme o dia passa, as T. silvestriana passam a dar preferência a “iscas” já dominadas pela colônia. Os autores pensam que isso seja um indicativo de que essa estratégia é especialmente adequada para encontrar recursos com alta qualidade, localizados e “efêmeros” (ou seja, que acabam rápido) e exauri-los antes que outras espécies ou colônias da mesma espécie o encontrem. Ao contrário dessas “saqueadoras”, a espécie T. fuscipennis, aquela que forrageia em grupos e chegou a ter mais de 300 indivíduos em uma mesma “isca”, tem uma “fidelidade”, ou constância extremamente alta. Como já foi dito, elas passaram um dia inteiro em uma mesma “isca” e provavelmente só encontraram outras porque pensaram que a que estavam usando havia acabado (quando foi fechada a noite). Os autores sugerem que esse comportamento seja adequado pra explorar recursos concentrados e que duram por mais tempo, pois conseguem “monopolizar” o alimento.


Bom, não encontrei fotos de novo... então coloquei um gráfico do artigo que cito aqui embaixo. Nesse gráfico está a quantidade de "iscas" encontradas pelas diferentes espécies de abelha sem ferrão ao longo do tempo durante o estudo. As iscas foram fechadas às 17 horas do dia 13 de agosto e reabertas as 9 do dia 14, por isso o eixo X não é contínuo.
T. testaceicornis é a IRAÍ (mas o nome científico atual é Nannotrigona testaceicornis). Sim, os bichos podem mudar de nome científico. Lembrando, a Iraí é aquela que forrageia de forma solitária. Vejam a quantidade de iscas que encontrou. A T. silvestriana é a "saqueadora", que consegue recrutar abelhas de forma eficiente, mas busca alimento de forma solitária. Por fim, a T. fuscipennis é aquela que forrageia em grupo. Bait= "isca".


Bibliografia:

- Hubbell, S.P. & Johnson, L.K. 1978. Comparative foraging behavior of six stingless bee species exploiting a standardized resource. Ecology 59(6): 1123- 1136.

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Abelhas que não comem pólen

A diversidade que existe entre as abelhas sem ferrão é impressionante.
A maioria das abelhas usa pólen como fonte de proteína. As Apis, a maioria das abelhas sem ferrão, as mamangavas...
Mas existe um grupo de abelhas sem ferrão que parou de usar pólen como fonte de proteína. São espécies que estão dentro do gênero Trigona (o mesmo das arapuás, guaxupés, abelha cachorro, mombucão e etc.). Vou falar de uma espécie especificamente, a mombuca carniceira (Trigona hypogea). Ao contrário do que o nome sugere (hypo vem do grego, significa embaixo/sob e geo, também no grego, significando terra, no sentido de "chão"), nas fontes que encontrei é mencionado que a espécie faz ninhos em cavidades ("ocos") de árvores, vivas (um pesquisador achou um ninho num tronco de pequi, inclusive!) ou mortas, com a entrada feita de resina e barro. São mansas, ao contrário de outras Trigona, como arapuá (T. spinipes) e guaxupé (T. hyalinata).
Em um levantamento da dieta de espécies de abelhas sem ferrão em um local onde havia sido encontrado um ninho de T. hypogea, a espécie nunca foi vista visitando flores. Essa espécie chegou a perder as "cestas" onde outras abelhas carregam pólen (corbículas), de tão especializadas que se tornaram em usar proteína animal. Mas não precisam ficar com nojo, essa proteína é modificada. Uma vez que uma abelha encontra um carcaça, ela "raspa" a carne e a leva até a colônia (na volta ela marca uma trilha de feromônios, e outras abelhas são rapidamente atraídas até a carcaça) e lá ela a deposita em potes especiais. Após isso, abelhas adicionam mel a esse pote. Esses potes ficam abertos por quase 1 dia e então são fechados e ficam por aproximadamente 14 dias, "maturando". Os pesquisadores acreditam que microorganismos presentes no mel (mel de abelhas caracteristicamente contém microorganismos) "processam" essa proteína animal, degradando-a. Eles abriram potes em diferentes estágios de "maturação" e foram vendo a transformação que a carne sofre ao longo do tempo. Logo que é adicionada ao pote, ela é uma massa mastigada, com a mesma cor que tinha no local onde as abelhas a coletaram; após isso, vai se tornando um fluido viscoso e no fim está clara, com aparência de mel, amarelada e homogênea. Elas não usam carniça, mas sim carne, que ainda não está se decompondo. Nenhum traço de carne podre foi encontrado nem nos potes e nem em nenhum outro local no ninho da T. hypogea.
Outra coisa interessante nessa espécie de abelha sem ferrão, é que elas foram observadas atacando as larvas de um ninho de vespas que havia sido abandonado. Lembram do que falei, sobre os sistemas de comunicação das abelhas sem ferrão? Pois é, essa espécie tem um sistema de comunicação tão eficiente, que foram capazes de encontrar essas fontes de proteína mais rápido que formigas (!). Larvas de insetos são uma fonte limpa e indefesa de alimento. Portanto, bem interessante para as abelhas. E os pesquisadores ainda especulam, baseado no modo "sofisticado" com que as abelhas tiraram proveito dos ninhos de vespa, que esse comportamento deve ser comum nessa espécie de abelha sem ferrão e que talvez as larvas sejam um complemento importante na dieta delas.
Uma abelha fantástica essa! Infelizmente nunca a vi. Não tenho fotos de ninhos pra colocar...

Bibliografia:

- Camargo, J.M.F. & Roubik, D.W. 1991. Systematics and bionomics of the apoid obligate necrophages: the Trigona hypogea group (Hymenoptera; Apidae: Meliponini). Biological Journal of the Linnean Society 44: 13-39.
- Mateus, S. & Noll, F.B. 2004. Predatory behavior in a necrophagous bee Trigona hypogea (Hymenoptera; Apidae: Meliponini). Naturwissenschaften 91:94–96.
- Noll, F.B., Zucchi, R., Jorge, J.A. & Mateus, S. 1996. Food collection and maturation in the necrophagous stingless bee Trigona hypogea (Hymenoptera: Meliponinae). Journal of the Kansas Entomological Society 69(4): 287-293.


domingo, 3 de novembro de 2013

Comunicação de abelhas

As Apis, abelhas que ferroam, conseguem comunicar onde existem fontes de alimento e outros materiais importantes para a colônia, como fontes de pólen e néctar, fontes de água e até possíveis locais para elas migrarem ou formarem outras colônias.
As nossas abelhas sem ferrão, também se comunicam, mas de outras formas, bem variadas.
Algumas espécies colocam em locais aparentes na vegetação, uma espécie de trilha, usando substâncias chamadas feromônios. Quando uma abelha encontra uma fonte interessante de alimento, deixa essas marcas pelo caminho, para que outras abelhas consigam voltar lá. Algumas dessas abelhas conseguem "polarizar" essas trilhas, para que as abelhas que as seguem consigam saber se estão se afastando ou se aproximando da fonte de comida.
Um pesquisador,  estudando a espécie Trigona amalthea percebeu que a distância entre uma marcação e outra variava. Como era um experimento, estava usando uma solução de água com açúcar em um recipiente. Só a mesa onde estava o recipiente recebeu várias marcas, mas conforme a abelha se distanciava, as marcações ficavam mais espaçadas. Para a espécie mandaguari amarela (Scaptotrigona postica), a distância entre as marcações foi medida, para confirmar se realmente havia diferenças e próximo a fonte de alimento, as marcações eram mais próximas umas das outras.
Já outras espécies, como mandaçaia (Melipona quadrifasciata) usam o que foi chamado de comunicação "visual". Abelhas foram observadas "guiando" companheiras de ninho em um vôo em zigue-zague, por distâncias de 30 a 50 m, em direção a alimentadores artificiais. 
Tem espécies que comunicam a fonte de alimento por som, como a Iraí (Nannotrigona testaceicornis). Nessa espécie, observaram que uma abelha que tenha acabado de voltar de uma viagem em busca de alimento, começa a fazer um barulho. Em seguida, as abelhas próximas começam a fazer barulho também e assim por diante. Logo, logo, o ninho todo começa a fazer barulho e todas as abelhas que estejam sem fazer nada, saem em todas as direções procurando por alimento. Já a mandaçaia (novamente) foi observada fazendo barulho na própria fonte de comida. 
Esses são só alguns exemplos de formas de comunicação entre as abelhas. Tem ainda outras.


Uma foto da abelha Iraí (Nannotrigona testaceicornis). Em São José dos Campo, São Paulo.

Bibliografia.

- Kerr, W.E., Ferreira, A. & Mattos, N.S. 1963. Communication among stingless bees - Additional data. Journal of the New York Entomological Society 71(2): 80- 90.
- Nieh, J.C. 2004. Recruitment communication in stingless bees. Apidologie 35: 159- 182.

sábado, 2 de novembro de 2013

I seminário de Apicultura no Cerrado.

I seminário de Apicultura no Cerrado.
Será realizado em Goiânia - GO, de 07 a 09 de novembro de 2013.

"Com uma programação técnica especifica para atender as necessidades do dia a dia do apicultor, o I Seminário de Apicultura do Cerrado terá palestras, clínicas tecnológicas, mesas redondas a disposição dos participantes. Uma novidade do evento é a realização da Rodada de Ideias, um espaço inovador voltado para conectar soluções técnicas e negócios entre os participantes. 
 Além das atividades técnicas, as participantes poderão conferir as novidades da 1ªFeira do Mel, exposição de artigos de interesse para o apicultor e para comunidade, como equipamentos para apicultura e produtos a base de mel, própolis, pólen, cera, geleia real dispostas na gastronomia, cosméticos, alimentos, saúde e beleza e artesanato. Haverá ainda oficinas de gastronomia, desfile de moda temático e palestras na área de saúde."



Maiores informações em: http://www.apiscerrado2013.com.br/

Começo de tudo

Há mais ou menos 1 ano e 3 meses, comecei a me interessar por abelhas. Especialmente as sem ferrão, por questões “logísticas”... ou ferroadísticas, como preferirem.
Estava no ônibus, voltando pra casa da faculdade e um desses vendedores que aparecem nos ônibus estava vendendo “mel de eucalipto”. Só faltou prometer vida eterna pra quem o tomasse. Já conhecia mel de eucalipto, mas fiquei com vontade de comprar. Comprei e pela primeira vez o tal do mel me chamou atenção.
Comecei a pensar nas abelhas... e não sei como, acabei me lembrando que pessoas “armam iscas” pra capturar abelhas. Porém, moro em um terreno pequeno para ter abelhas com ferrão (Apis mellifera), daí o problema logístico que falei: ter abelhas com ferrão poderia prejudicar vizinhos e parentes. Me veio à cabeça, não sei como, a lembrança de que existem também abelhas que não tem ferrão e que essas, ao contrário da Apis, são nativas do Brasil. Fiquei curioso pra saber se iscas também funcionavam com as nossas...
Cheguei, fui fuçar no google e descobri, antes de tudo, que o que chamava de “jataí”, na verdade se chama “arapuá” (ou Trigona spinipes). Aquelas abelhas pretas que adoram se enrolar em cabelos alheios... mas também vi que temos como capturar abelhas nas “iscas” sim. Tudo que precisava era.... “cerume”! O que raios é cerume e onde eu encontro isso?*
Procurei mais e vi uma sugestão de que cera de Apis e própolis de garganta (sim, desses vendidos em farmácia) também funcionavam para atrair enxames. O própolis foi fácil conseguir, o problema foi a cera... perto (pros padrões de onde moro) de casa, a uns 3,5 km, tem uma casa agropecuária, então fui ver lá. Obviamente, não ia achar de primeira e nem tão perto de casa alguma coisa que queria. Tive que ir em outra loja bem mais longe, mas achei a cera.
Depois foi fácil.
  1. Pinguei o própolis de garganta em uma garrafa pet de 1,5 l. Esperei o álcool do própolis evaporar;
  2. Embalei a garrafa em jornal, o suficiente para o interior da garrafa ficar escuro mesmo quando eu olhasse embaixo de sol do meio dia e embalei essa garrafa em um plástico, com objetivo de proteger o jornal de eventuais chuvas;
  3. Fiz um buraco na tampa da garrafa, com 1 cm de diâmetro mais ou menos;
  4.  Só faltava a cera. Não sabia como manipular, então acabei escolhendo primeiro o método português, obviamente: coloquei a cera em um vidro, o vidro em uma panela com água e a panela no fogo. A cera começou a derreter conforme a água esquentava, mas quando tirei o vidro da água, deu o maior trabalho pra pegar a cera de dentro do pote para passar na garrafa e acabou ficando a maior parte da cera lá no pote.**
  5. Depois de colocar a cera em volta do buraco da tampa da garrafa e no gargalo dela, “instalei” a isca. Ou seja, coloquei em um lugar onde não batesse sol e não ventasse muito.
Depois de uns 20 dias de extrema ansiedade, olhando as iscas quase de hora em hora, vi umas jataizinhas rondando a entrada da isca... e lá elas ficaram. Meu primeiro enxame tinha chegou e comecei a me interessar por esses bichos mais e mais.
Pretendo contar o pouco que sei sobre elas, resumir artigos interessantes que leio e falar de outros bichos também. Sou biólogo então nem sempre o que escrever aqui vai uma relevância prática clara... e além disso, o interesse pelas abelhas me levou a outros bichos “sociais”, como vespas e formigas. Pretendo falar deles também, quando achar coisas legais.

*= Cerume é uma mistura de cera produzida pelas abelhas, com resinas vegetais (de várias espécies de plantas diferentes). As abelhas com ferrão, diferente das sem, usam cera pura no ninho. Um amigo meu do facebook me sugeriu um site que vendia cerume de jataí, e nos outros enxames que capturei, usei esse cerume. Mas acho que não se vende mais cerume por lá.


**= É muito melhor colocar a cera de Apis direto na água para amolecer e assim poder modelar. A cera não se mistura com água, então vai ficar boiando e o desperdício vai ser muito menor que no meu método lusitano inicial.


Vocês vão ver que o plástico está roído. As abelhas decidiram que ele estava incomodando a rotina delas e resolveram o problema facilmente. O plástico era bem vagabundo, então roeram facilmente. Fiquei preocupado se faria mal a elas, mas não fez. Não garanto que nenhuma morreu de indigestão... mas o enxame como um todo está ótimo.